Friday 30 November 2012

1 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?






(Mas para mudar, é preciso livrar-se - de verdade - dos paradigmas, dogmas e valores que impedem a mudança...)

2 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


DRUIDISMO: UMA DEFINIÇÃO

"O druidismo não se satisfaz com a mera compilação de certas práticas rituais mais ou menos mágicas; o druidismo possuía uma amplitude espiritual admirada pelos gregos e romanos, mesmo sem que estes a compreendessem. O druidismo é, certamente, uma das maiores e mais exultantes aventuras do espírito humano, uma tentativa de conciliar o irrencociliável - o individual e o coletivo, o criador e a criatura, o bem e o mal, o dia e a noite, o passado e o futuro, a vida e a morte, corajosamente especulando sobre o 'vir a ser'."
-- Jean Markale, 1985


3 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


VALORIZAÇÃO DO FEMININO

Ao resgatar o Feminino através da redescoberta de valores, princípios e percepções da cultura celta e sua espiritualidade, cada um de nós pode vivenciar o RE-EQUILÍBRIO entre as forças masculina e feminina da Vida: o 'Casamento Sagrado' que torna a vida criativa e fértil nos níveis pessoal, inter-pessoal e coletivo.









4 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


VERDADE

Poucas coisas eram mais importantes para os celtas do que a Verdade e sua forma de expressão: a Palavra.

Por seus bardos medievais, pelos juramentos dos heróis e nobres celtas, pela profundidade dos versos de seus modernos poetas, a Irlanda mantém viva a herança da VERDADE: seus saberes, mitos e lendas nos oferecem o resgate dessa Verdade em nossas vidas: ser verdadeiro no que se faz, ser verdadeiro consigo mesmo, saber qual é a SUA VERDADE, integrar esta à Verade do Todo.


5 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


AUTO-CURA...

A constatação do grande psicólogo C.G. Jung explica de que forma o contato com uma cultura - no caso, a celta - voltada à integração com o mundo em que vivemos e conosco mesmos pode ser uma poderosa ferramenta de auto-cura.


6 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?

INTEGRAÇÃO...


7 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


UM NOVO OLHAR

Uma nova forma de ver as coisas...

"As coisas são porque as vemos, e o que vemos, bem como a forma como as vemos, depende das Artes que nos influenciaram.

Olhar para algo é muito diferente de VER algo. Não somos capazes de VER algo até que enxerguemos sua beleza. Então, e somente então, ela vem a ser."
- Oscar Wilde


8 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


UNIÃO COM A NATUREZA

Às vezes a gente pára, olha em volta e vê um monte de coisas de que não gosta, que considera errado - e sente falta de uma filosofia, espiritualidade ou coisa do gênero que nos traga a força que nos inspira a seguir, a mudar, a melhorar.

Não é lindo quando essa filosofia existe logo ali?


9 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


INTERPRETAÇÃO

Se "a História constantemente se assemelha ao mito porque, no fundo, ambos são feitos da mesma matéria" (J.R.R. Tolkien), compreender a real profundidade dos mitos e lendas nos ajuda a entendermos mais profundamente nossa própria história, tanto pessoal quanto coletiva. Para isso, é fundamental uma interpretação mais informada das lendas e mitos que informam o pensamento e o sentimento celta.


10 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


ESPONTANEIDADE

"SER ESPONTÂNEO É LIBERTAR-SE DA JAULA DO EGO, CRENDO NAQUILO QUE ESTÁ ALÉM DO SELF."

Talvez seja sua história ímpar entre as nações européias, talvez sua geografia isolada, talvez estes e muitos outros fatores: o fato e que a Irlanda e suas gentes de fato têm um quê de irreverência, de espontaneidade, de liberdade que a frase do filósofo irlandês John O'Donohue tão bem resume.


11 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


EXPRESSÃO

De acordo com teorias linguísticas, "o idioma que um povo fala exerce forte influência sobre sua percepção sensorial” - a frase na imagem reforça essa teoria e explica porque os mitos e histórias da Irlanda têm tanto a nos ensinar: ao preservar o espírito celta da livre expressão e da poesia em sua literatura, os irlandeses - ainda que inconscientemente - nos oferecem uma chance de resgatar o lúdico e o poético (criativo) em nossa visão do mundo e sua consequente expressão.



12 - Druidismo & Espiritualidade Celta: O que temos a ganhar?


EQUILÍBRIO

Ao tecer essa comparação, a poetisa de origem irlandesa Anne Hartigan propõe diversos subtemas a serem deprendidos de suas entrelinhas:

- o pensamento ocidental limitou a percepção do mundo a uma abordagem binária;
- essa é uma visão bastante estreita, visto que é dessa percepção que surgem radicalismos, preconceitos e intepretações fundamentalistas da realidade;

Por ser includente, não linear e não binária, a mente e a alma celtas preservaram uma identidade e uma compreensão da realidade livre das limitações modernas, e pode, por isso, servir de guia para todos aqueles que buscam livrar-se das limitações e falhas da percepção do mundo como uma eterna e infindável luta entre os opostos. Para a visão celta, o universo é a soma dos opostos - e de todos os pontos que os separam, formando um todo orgânico, fluido e contínuo, em que todas as coisas interagem de forma natural - tanto na esfera humana quanto na divina, tanto no dia quanto na noite, tanto nos arquétipos masculinos quanto nos femininos.

É da soma e integração de todos que se redime o Todo.




Monday 26 November 2012

Entrevista: Intranet CMSP


Abaixo, uma matéria lançada na intranet da CMSP em 2009...
Um druida na Câmara Municipal
Claudio, funcionário público, trabalhando em SGA.3
A Câmara Municipal de São Paulo é um dos últimos lugares onde você esperaria encontrar um druida. Manja druida? Aqueles magos de longas barbas brancas dos povos celtas, tipo o Gandalf do "Senhor dos Anéis" ou o Dumbledore de "Harry Potter"? Pois é. Cláudio Quintino Crow, 40 anos, técnico administrativo de SGA.3 (Secretaria de Infraestrutura), é um deles.
Esqueça barbas longas e caldeirões borbulhantes. Para começar, nem todos os druidas que viveram na Europa Ocidental antes de Cristo eram anciãos barbudos. Inseridos em uma cultura que valorizava o feminino, vários druidas eram mulheres. E não eram exatamente magos, ou, pelo menos, não eram só isso. Além de adivinhos e curandeiros, os druidas eram também conselheiros do rei, juristas, legisladores, poetas e contadores de histórias.

E o druidismo, para Claudio, não tem nada a ver com rituais exóticos para serem praticados sob o luar depois do expediente. E é mais do que uma religião − no sentido de que não é uma crença para ser celebrada com orações e cerimônias em dias marcados. É um jeito de saber viver que ensina a ver todo lugar e momento como sagrados e a agir com honra em todas as atividades do dia a dia.

− Eu não oro, eu vivo − é como Claudio explica sua relação com o druidismo.

No começo, contudo, foram mesmo os magos barbudos da lenda e da cultura pop que despertaram o seu interesse pelos druidas. Tinha pouco mais de dez anos e se chamava apenas Claudio Quintino quando conheceu seus primeiros druidas: o mago Merlin, dos livros sobre o lendário rei Arthur, e o druida Panoramix, dos gibis de Asterix. A partir deles, o menino passou a ler tudo o que encontrava sobre druidas e celtas − povo europeu da Antiguidade que deixou suas marcas, principalmente, na Irlanda, no Reino Unido e na Gália.

Com 16 anos, Claudio começou a trabalhar na Câmara como auxiliar de serviços gerais - e gastava boa parte do salário em livros importados, já que a bibliografia em português sobre seus temas favoritos era escassa. Naqueles tempos anteriores ao Google, a vida não era nada fácil para um office-boy autodidata da zona sul de São Paulo, obrigado a comprar as obras aleatoriamente, sem qualquer referência de qualidade. Irredutível, desbravou centenas de livros de história, antropologia, arqueologia, mitologia. A essa altura, o moleque que curtia histórias de cavaleiros andantes da Távola Redonda cedia lugar a um pesquisador da cultura celta.

As leituras fascinaram Claudio com histórias de uma cultura da Antiguidade que colocava homens e mulheres em pé de igualdade e via o sagrado em todos os aspectos da natureza. Ficou convencido de que a humanidade havia perdido muito com o desaparecimento da espiritualidade celta.
− Um rio, por exemplo, era para os celtas o corpo de uma divindade. Poluir um rio seria como destruir um deus − compara.

Em 1996, o fascínio o empurrou para uma viagem pelos pontos míticos da Irlanda, onde uma tarde chuvosa marcaria sua vida. Sobre a pequena colina de Tara, considerado "o coração espiritual da Irlanda celta", Claudio sentiu os olhos mareados e experimentou a sensação de voltar para casa. Nos anos seguintes, entrou em contato com estudiosos que buscavam reconstruir a espiritualidade druida, baseado nos vestígios deixados pela civilização celta. Após uma segunda viagem a terras irlandesas, em 1999, tornou-se representante brasileiro da The Druid Network, maior organização druídica internacional.

Naquela época, Claudio adotou o nome de Crow e fez sua primeira tatuagem, a imagem do corvo que esvoaça em seu braço direito.

− O corvo é um mensageiro entre a nossa realidade e os outros mundos. É o que procuro ser, sem qualquer sombra de presunção − diz.
Claudio, músico, cantando em celebração do Ano-Novo Celta no pub paulistano O’Malleys
Como um corvo, Claudio busca trazer para a atualidade as mensagens do mundo druídico e da cultura celta por meio de cursos, workshops, palestras, do seu site www.claudiocrow.com.br e da música. Tocando violão e “tin whistle” (flauta doce de metal tradicionalmente irlandesa), realiza shows de música tradicional irlandesa em que alterna canções com histórias, mitos e curiosidades, tanto em apresentações solo como acompanhado de amigos.

Já publicou dois livros sobre a espiritualidade celta − "A Religião da Grande Deusa" (Gaia) e "O Livro da Mitologia Celta" (Hi-Brasil) −, mas não tem planos de escrever outros. Claudio não gosta de como o papel cristaliza em texto as suas ideias, que estão sempre em movimento. “Hoje não aproveitaria nem 50% do primeiro livro que escrevi”, conta. O veículo ideal para o corvo levar suas mensagens é mesmo a internet, que permite a Claudio atualizar os textos à medida que faz novas descobertas e revisa suas noções.
Foi em um de seus cursos que Claudio conheceu Carina, com quem foi casado por quatro anos. Eles têm uma filha de dois anos chamada Brigitte − em homenagem à deusa Brighid, que o cristianismo transformou em Santa Brígida, uma das várias heranças deixadas pela tradição celta na cultura ocidental.

Claudio, pesquisador, realizando palestra no III International Symposium of Irish Studies (2008), na Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Dono de uma barba ainda muito curta e escura para ser identificada com a imagem popular dos velhos druidas, Claudio carrega outras duas tatuagens. No seu braço esquerdo, floresce uma árvore, numa referência à origem do termo druida, que significa "aquele que tem a sabedoria do carvalho". A imagem resume o ideal de perfeição que os druidas almejavam: um ser que consegue sobreviver em harmonia com o que o cerca, mesmo sem se mover nem destruir outras vidas. A terceira tatuagem é o lema do mitólogo Joseph Campbell, "Follow your bliss", que Claudio traduz como "Siga o que o torna pleno".

É essa plenitude que permite a um druida de barba e tatuagens se adaptar a uma realidade aparentemente tão diferente que é trabalhar no expediente de SGA.3, cuidando da tramitação de documentos relacionados à infraestrutura da Casa. É que, segundo a visão druida, não há oposições: todas as diferentes realidades fazem parte de uma unidade, ensina Claudio.

− Todo o universo é feito da mesma matéria e tudo está conectado − afirma. Corpo, mente e espírito devem estar em união. O corpo sem o espírito cai no materialismo. A mente sem o corpo transforma você num nerd. E o espírito sem o corpo o deixa alienado.

Para o trabalho e a vida, vale a mesma visão de integridade, plenitude e honra.

− Como eu disse, eu não oro, eu vivo. Todo lugar e todo momento é sagrado. O meu trabalho é sagrado, porque me permite comprar meus livros e educar minha filha. Por isso, eu honro o que faço trabalhando da melhor forma possível.

Entrevista "Todos os Clãs" (2011)


Sempre acreditei que uma das melhores formas de conhecer as ideias de alguém é através de entrevistas - no meu caso, acho bacana receber as perguntas que, muitas vezes, me levam a abordar temas por prismas que normalmente eu não usaria. Eis porque gosto muito de partilhar minhas entrevistas, mesmo que já não tão atuais...

Abaixo, as respostas concedidas ao blog "Todos os Clãs" em 2011.


Como é ser Claudio Crow?
Crow -  É ser pai, filho, namorado, amigo, funcionário, músico, pesquisador, aluno, instrutor... como qualquer outra pessoa, mas com uma busca incansável pela percepção do sagrado em tudo isso.
O que te inspira a escrever?
Crow - Aprender. Sempre que recebo algum conhecimento, preciso processar e expressar - mesmo que só para mim, às vezes.
 Você como escritor, como contaria a “Infância de Claudio Quintino Crow”
Crow -  como uma infância absolutamente normal, em que a curiosidade e ousadia de todas as crianças foi incentivada por um pai muito culto e uma mãe professora. Com eles, aprendi a aprender - o que facilitou muito o desenvolvimento do Claudio pesquisador - eles lançaram a semente, despertaram o buscador em mim; a eles sou eternamente grato por isso.
Na época que você estudava você fez muitos amigos? E esses te acompanham ate hoje?
Crow - Tenho um círculo de amigos muito íntimos que já conta quase três décadas de convívio intenso e constante. Considero-me um privilegiado, pois essas amizades me deram uma baliza perfeita para identificar o que é uma amizade profunda, autêntica e verdadeira de outras que tendem ao passageiro e ao superficial. Nada contra, pois a vida é feita de todas elas: mas é muito importante sermos capazes de identificar os diferentes níveis de associação para evitarmos expectativas excessivas e as inevitáveis decepções.
 Fora a vida “Social Pagã” como é ter uma vida normal?
Crow -  Vida “normal”? Se alguém diferencia a vida espiritual da vida quotidiana é porque não entendeu o que é espiritualidade.
As pessoas te buscam por motivos corriqueiros como, Amor, Prosperidade..:
Crow - Já houve quem o fizesse, já houve quem viesse a mim atrás de ‘poder’ - ou melhor, de ilusões de poder relacionadas ao material, ao emocional, ao espiritual... Mas quem fazia isso inevitavelmente saía frustrado, porque não creio na magia como algo externo, como um processo que possa ser delegado a terceiros: ou você segue seu próprio caminho com suas próprias pernas, ou está parado, sendo enganado e enganando a si mesmo.
Como é ser um Pai Druida, a educação de seus filhos é melhor pelo fato de você viver sob as bases de uma pratica que respeita “o Outro” e respeita a natureza?
Crow - Em primeiro lugar, eu evitaria usar o rótulo ‘druida’ ou qualquer outro: afinal, muito do que creio e tento transmitir é encontrado também em outras filosofias e espiritualidades, sem fronteiras nem limites. Isto posto, é bom dizer que não há como definir se essa educação é ‘melhor’ ou ‘pior’: mas é evidente que os princípios e valores que transmito a minha filha estão alinhados a uma “nova velha percepção” do que seja a vida, do que seja a coletividade, do que seja a natureza, de qual seja a importância de compreendermos e trabalharmos as diversas relações e conexões que estabelecemos com o mundo em que vivemos - seja com outras pessoas ou criaturas, seja com a sociedade de que fazemos parte, seja com as ideias e a natureza de nosso trabalho...
Você já escreveu um livro, já teve filho e é provável que já tenha plantado uma arvore... Segundo o ditado popular japonês isso é tudo o que o homem precisa pra ser completo, ao ser ver isso é certo, ou falta alguma coisa nessa lista?
Crow - Já escrevi dois livros, tenho uma filha linda e já plantei incontáveis árvores... São contribuições, legados que deixamos ao mundo em nossa existência. Os livros são ideias e conceitos, as árvores são estruturas e eixos, os filhos... os filhos são a principal forma de mostrarmos nosso apreço pelos deuses, pela Vida com V maiúsculo. Gerar um filho é o ato que mais nos aproxima dos deuses, pois é a Vida que flui através de nós e ultrapassa os limites de nossa própria identidade. É algo tão grandioso em sua naturalidade que é impossível por em palavras. Mas de nada adianta escrever um livro, plantar uma árvore ou ter um filho se não se toma consciência dos processos envolvidos, desde as motivações primordiais até as possíveis conseqüências de cada um desses gestos. Portanto, faça o que for, mas faça-o com consciência. Esta é a chave.
O que um Druida faz, pratica [costumes]?:
Crow - Melhor seria perguntar a um deles! Hoje há tantas e tão diversas correntes que se denominam druídicas que seria irresponsável responder - seria somente o meu ponto de vista.
Você já sofreu preconceito por ser o que você é? [comenta :D] como proceder em casos assim?
Crow - Só sofre preconceito quem se põe de fora da sociedade em que vive, quem se mostra deliberadamente diferente, quem carrega bandeiras ou ostenta rótulos sem levar em consideração a sensibilidade coletiva. Jamais tive esse tipo de problema. Ter sido músico na adolescência, em meados da década de 1980 me ajudou muito a entender isso: por ser cabeludo numa época em que quase nenhum rapaz usava cabelos longos, encontrava algum preconceito em situações profissionais, mas percebi que uma postura coerente e civilizada - no sentido real, de ser coerente com os valores e princípios da sociedade a qual pertencemos - logo dissipava qualquer preconceito inicial. Isso me fez perceber que o apego excessivo a uma postura externa, a um título ou rótulo pode, sim gerar preconceito e discriminação - e isso se aplica não só às espiritualidade,s mas a qualquer área da vida.
Como é estar na Irlanda e Grã-Bretanha?
Crow - As ilhas britânicas eram um sonho antigo, que eu acalentava desde a adolescência. Ter tido a chance de visitar aquelas terras por duas oportunidades foi algo sem dúvida mágico, mas ajudou a desenvolver uma percepção mais profunda de mim mesmo, de quem sou e do que eu realmente buscava naquelas terras. Esse foi o elemento mais transformador: olhar para as paisagens irlandesas e nelas enxergar o espelho que, pouco a pouco, revelou-me quem eu era e o que eu queria.
Há nove anos você lançou um livro, tem previsão de quando sai outro?:
Crow - A dinâmica da vida de pai e um certo desconforto com o engessamento de ideias que um livro causa não me permitem pensar, ao menos por hora, em lançar outro livro.
 Como foi escrever o “A Religião da Grande Deusa”.
Crow - Foi curioso: àquela altura (estamos falando de 2000) eu já tinha mais de dez anos de pesquisas e práticas de espiritualidades alternativas, e sentia que havia uma imensa carência de informação sólida: a matriz intelectual dos primeiros anos do paganismo do Brasil era norte-americana e nem sempre muito bem informada, havia muita mistificação e desinformação. Isso me levou a pesquisar muito, e o resultado foram as minhas primeiras palestras - apresentadas na época de ouro da Alemdalenda como centro de cultura pagã, na primeira metade da década de 1990. Minhas palestras me levaram a ser convidado pela saudosa e genial Heloisa Galves - sem dúvida o nome mais importante do neo-paganismo brasileiro - primeiro para traduzir alguns livros (eu já trabalhava profissionalmente como tradutor) e depois a lançar um livro autoral, com as informações que eu compilara em minhas pesquisas e palestras. O resultado foi um livro que se chamava “Raízes e Sementes: origens e filosofia do paganismo moderno”. Mas a editora rejeitou o título, temendo que com esse nome ele fosse parar nas prateleiras de botânica e jardinagem das livrarias... o título que eles escolheram foi “A Religião da Grande Deusa” - um título que, a meu ver, não reflete o conteúdo do livro.
Em 2000 houve um grande “BUM” com relação a Wicca e Espiritualidade Pagã... muita gente começou a falar em nome da Deusa... Como você vê o movimento hoje?
Crow - Estou bastante afastado, por uma série de motivos. Mas vejo um amadurecimento lento e progressivo das ideias e conceitos pagãos por aqui, cada vez mais projetando uma filosofia real de vida e cada vez menos preocupada com rótulos, títulos, linhagens, adereços e instrumentos. Bom sinal.
O que você acha que causou esse sensacionalismo?
Crow - Não usaria a palavra sensacionalismo. O que eu vi foi o deslumbre com ideias potencialmente revolucionárias - reintegração do universo humano à natureza, revalorização do Feminino na espiritualidade e assim por diante. Mas é como eu disse ao responder sobre as motivações que me levaram a escrever meu primeiro livro: havia muita mistificação e falta de embasamento histórico. Esse quadro está mudando, ainda bem.
Como “O Livro da Mitologia Celta” afetou o meio pagão pela sua ótica?
Crow - Honestamente, não saberia responder. Sei que até hoje recebo muito feedback positivo para esse livro, creio que por conta da abordagem prática que ele propõe ao se trabalhar os mitos e lendas celtas. Prática não no sentido de oferecer os já malhados “receituários” para ritos e encantamentos, mas sim por propor uma reflexão individual acerca dos símbolos e mensagens presentes nas narrativas mitológicas, no simbolismo dos elementos que compõem essas narrativas, nas características individuais de deidades e figuras míticas neles presentes. Claro, houve críticas também: houve quem dissesse que minha abordagem dessacralizava os mitos, tornando-os muito próximos - ranço judaico-cristão, sem dúvida. E também aqueles que disseram que meu livro era por demais acadêmico em sua abordagem. Acolho muito bem essas duas críticas, eram esses mesmos os meus objetivos (risos).
Como foi fazer “O Livro da Mitologia Celta”?
Crow - Um enorme prazer e um enorme desafio. Muitas pesquisas, muitas noites sem dormir, e uma necessidade enorme de manter o foco dentro da estrutura pré-estabelecida. Porque a sequência dos capítulos não é mero acaso, cada um deles está onde está por um motivo específico: a leitura do livro na ordem proposta é como uma jornada, uma viagem iniciática pelos mitos e lendas celtas, mas principalmente pela estrada mítica que pode nos conduzir ao interior de nós mesmos, à nossa essência mais profunda, dentro de um enfoque celta.
Teve algum momento que você se questionou, ou questionou sua fé durante esses anos?
Crow - Faço isso diariamente. Ajuda a manter a sanidade, a eliminar arestas, a deixar para trás o que não serve mais, a abrir espaço para a progressão.
Poderia nos ensinar algumas coisas dessa grande cultura?
Crow - O legado dos celtas para nossos tempos é muito vasto e amplo, e mais ainda: é muito válido: escolha você, leitor, qual a sua maior necessidade: estabelecer uma relação mais harmoniosa com o mundo em que vive? Resgatar a criatividade artística de seu interior? Compreender melhor a ciclicidade do tempo e da vida? Entender maneiras de reavaliar o papel da mulher e do feminino em nossa cultura? Tudo isso e muito mais a cultura celta nos propõe...
O que é necessário para seguir o Caminho Druídico hoje?
Crow - Vamos diferenciar “ o caminho druídico” do “caminho celta”. Por que? Porque muitas correntes espirituais que se denominam druídicas hoje são cristãs, por exemplo. Nada de errado, levando-se em conta o inegável desenvolvimento histórico da cultura celta. Da mesma forma, há correntes cristãs hoje que bebem diretamente na fonte filosófica celta, ou seja: os caminhos se entrelaçam e se misturam de forma semelhante aos famosos entrelaçados da arte celta tradicional. No fundo, pouco importa se alguém se diz celta, cristão celta ou druida: o que realmente importa é se essa pessoa se identifica com os valores culturais e filosóficos que são, em sua origem, celtas. E quais são esses valores? Tanto em sua fase pré-cristã quanto após a adoção do cristianismo, a Alma Celta perserva sua essência: a valorização da palavra como fonte de poder (pela poesia, pelo encantamento, pelo juramento, pela maldição); a rejeição da linearidade (tanto do tempo quanto do espaço), a íntima proximidade das forças da natureza personificadas nos deuses e heróis, a sacralidade da paisagem... todas essas características são encontradas nos textos e ensinamentos irlandeses tanto de antes quanto de depois da chegada do cristianismo. É dessa essência, dessas características fundamentais da Alma Celta que estou atrás - não me importa se elas surgem na matriz pagã ou pré-cristã.
No seu site você diz “Os deuses vivem através de nossas vidas” poderia falar sobre?
Crow - Os deuses, em última análise, são as personificações das grandes forças da natureza: tanto as forças da natureza externa, da paisagem - o tempo, o fogo, o vento, a fertilidade da terra, etc. - quanto as forças da nossa natureza individual: as emoções, a criatividade, a luta, a sexualidade. Durante nossas vidas, no dia-a-dia mesmo, vivenciamos essas forças internas e externas com muito mais freqüência do que a maioria de nós percebe: diariamente, nossas ações nos conduzem pelos domínios dos deuses e deusas do amor, da guerra, da morte, da paixão, da cura. Basta abrirmos os olhos e eles estarão ali, ao nosso lado, dentro de nós.
 Como é aprender com John Matthews?
Crow - John é antes de mais nada um grande amigo, alguém com quem estabeleci uma cumplicidade que vai além dos estudos de espiritualidade e treinamentos xamânicos. Isso tornou a experiência toda mais fácil e muito enriquecedora. Ao mesmo tempo, ele é bastante exigente, propondo muita reflexão e questionamento em suas conversas. O mesmo vale para a Emma Restall Orr. Tanto o John quanto a Emma foram capazes de produzir aquele momento mágico de questionamentos internos muito profundos que geram a quebra de nossas crenças e valores íntimos e que só assim permitem o desenvolvimento de um aprendizado verdadeiramente transformador. Antes de mais nada, tanto o John quanto a Emma se tornaram almas amigas, com quem mantenho contato constante há anos.
Você fez muitas Traduções durante sua Vida, inclusive o Livro “Aradia o Evangelho das Bruxas” como é traduzir um dos livros mais famosos da Bruxaria, um livro que inspirou tantas tradições Inclusive as mais tradicionais como a Wicca Gardneriana...?
Crow - 'Aradia' é uma interessante obra, típica da virada do Século XIX para o XX. Apresenta-se como uma compilação de “textos perdidos” mantidos em segredo desde tempos imemoriais, exatamente como as obras de Gerald Gardner e também de Aleister Crowley. Todos esses textos refletem o universo do ocultismo do fin de siécle, obcecado por linhagens hereditárias que, supostamente, validassem seu conteúdo. Mais do que isso, refletem também os anseios conscientes e inconscientes de uma sociedade em transformação: tanto o movimento literário conhecido como “Romantismo” quanto essas e outras obras de natureza espiritual revelam-se como respostas, verdadeiras reações ao crescente processo de urbanização e industrialização do mundo. Eram tentativas (conscientes ou não) de se manter vivo o apreço pelos valores campesinos, pela vida em grupo e em contato com a natureza, pelos espíritos vivos dessa natureza que, criam os autores da época, eram a tônica das sociedades primitivas da Europa pré-romana. Até que ponto o que essas obras apresentam é historicamente comprovável é matéria para longos debates, mas no fundo não é isso que interessa: o que realmente importa é que elas surgem como uma tentativa de se criar uma alternativa ao modo de vida que começava a se descortinar pelo mundo ocidental - e que, hoje sabemos, traz mais problemas do que soluções.
Claudio, pra finalizar conta pra gente seus planos para o futuro, projetos, cursos, formas de entrar em contato com você...
Crow - Planos para o futuro? Não os faço! Prefiro ficar de olho no horizonte, para tentar vislumbrar o que está por vir, com a certeza de que há sempre uma saudável alternância entre períodos de expansão e reclusão, atividade e passividade, semeadura e colheita... compreender a ciclicidade do tempo nos deixa mais flexíveis quanto a planos, pois assim como para o agricultor basta uma geada ou uma estiagem para por tudo a perder, também em nossas vidas basta um pequeno evento para mudar a direção de nossos passos...
Mas deixando de lado a resposta mais filosófica (não que ela não seja válida!) e falando em termos práticos, passei quase dois anos em um “período sabático” - algo que faço de tempos em tempos para reavaliar minhas crenças e valores, meu trabalho e minha vida pessoal. Foi também um período de extensas pesquisas em diversas áreas, e o resultado é o surgimento de um novo curso, que se inicia em junho de 2012, chamado “Alma Celta: uma Jornada ao Sagrado”. Esse curso é fruto das minhas experiências pessoais e de minhas pesquisas, e tem por objetivo entender como o Sagrado, dentro de um ponto de vista celta, não aceita fronteiras nem rótulos, ultrapassando os limites geográficos, culturais e cronológicos. Apresentei recentemente uma prévia desse estudo na forma de uma palestra no 5o. Simpósio Sulamericano de Estudos Irlandeses, e a julgar pelo feedback que recebi, a coisa promete!
Maiores informações sobre meu trabalho - bem como sobre cultura celta e irlandesa - podem ser obtidas em meu website: www.claudiocrow.com.br, e também em meu blog: http://claudiocrow.blogspot.com.br/. Esses, aliás, são os melhores canais para os que desejam entrar em contato comigo.
Espero que esteja a contento, e desejo sucesso na reativação da proposta de “Todos os Clãs”!

Abraços,
Claudio Quintino Crow
(Originalmente publicado em 30 de maio de 2011: http://todososclas.blogspot.com.br/2011/05/claudio-crow-quintino.html)

Friday 23 November 2012

"SÓ SABE PARA ONDE VAI QUEM SABE DE ONDE VEM."

De todas as muitas e belas lições recebidas de meu resgate de espiritualidades ditas 'primitivas', esta permanece sendo a mais importante:

"SÓ SABE PARA ONDE VAI QUEM SABE DE ONDE VEM."

Jamais negue suas origens, jamais esqueça quem lhe fez ser o que é - de corpo, mente e espírito.




"As almas de meus Ancestrais se projetam através de minha pele e por minhas memórias eles vivem novamente. Nunca se esqueça de onde você vem."



Palco / Tempo

Pense num evento marcante na História da Humanidade, ou do mundo: uma guerra, uma revolução, o fim de uma era...

Qualquer desses eventos não é nada no 'grande esquema das coisas', na 'Grande Duração' do Tempo.

Por que então um determinado evento de sua vida (por maior que ele seja) seria mais importante?

RELATIVIZE: entenda o evento em sua vida como parte de um processo, de uma estrutura mais ampla, que lhe ajuda a entender a natureza desse evento: e ao compreender a natureza desse evento você entenderá que nele próprio está a sua origem e seu desfecho.

(O grande ponto, portanto, é mudar o foco e entender o que é o palco...)






Thursday 22 November 2012

Monday 19 November 2012

De volta à blogosfera...

Eis que, depois de uns bons dois anos sem blogar, resolvi reabrir este canal. Tudo novo, claro - somente aos poucos recolocarei aqui alguns (poucos!) textos de meu velho blog que ainda julgo pertinentes. A ideia central, contudo, permanece a mesma: COMPARTILHAR, OPINAR, PROVOCAR, CONVIDAR, DIVULGAR... Em breve, muito breve, começarei as postagens...